25.02.2023

1º Domingo da quaresma

 

Evangelho segundo Mateus 4, 1-1. 

O episódio das “tentações de Jesus” é um relato que não devemos interpretar com rapidez. As tentações que se nos descrevem não são propriamente de natureza moral. O relato adverte-nos de que podemos arruinar a nossa vida sem nos desviarmos do caminho que segue Jesus.

A primeira tentação é de importância decisiva, pois pode perverter e corromper a nossa vida desde a raiz. Aparentemente, a Jesus se lhe oferece algo inocente e bom: colocar Deus a serviço da sua fome. “Se és Filho de Deus, ordena que estas pedras se convertam em pães”.

No entanto, Jesus reage de forma rápida e surpreendente: “Não só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus”. Não fará do seu próprio pão, um absoluto. Não colocará Deus a serviço do seu próprio interesse, esquecendo o projeto do Pai. Sempre procurará primeiro o reino de Deus e a Sua justiça. Em todo o momento escutará a Sua Palavra.

As nossas necessidades não ficam satisfeitas só com ter assegurado o nosso pão material. O ser humano necessita e deseja muito mais. Inclusive, para resgatar da fome e da miséria a quem não tem pão, temos de escutar a Deus, nosso Pai, e despertar na nossa consciência a fome de justiça, a compaixão e a solidariedade.

A nossa grande tentação é hoje converter tudo em pão. Reduzir cada vez mais o horizonte da nossa vida à satisfação dos nossos desejos; viver obcecados por um bem-estar sempre maior ou fazer do consumismo indiscriminado e sem limites o ideal quase único das nossas vidas.

Enganamo-nos se pensamos que esse é o caminho que se tem de seguir para o progresso e a libertação. Não estamos vendo que uma sociedade que arrasta as pessoas para o consumismo sem limites e para a autossatisfação não faz senão gerar vazio e falta de sentido nas pessoas, e egoísmo, ausência de solidariedade e irresponsabilidade na convivência?

Por que estremecemos quando vemos aumentar de forma trágica o número de pessoas que se suicidam a cada dia? Por que continuamos fechados no nosso falso bem-estar, levantando barreiras cada vez mais inumanas para que os famintos não entrem nos nossos países, não cheguem até nossas residências nem chamem à nossa porta?

A chamada de Jesus pode-nos ajudar a tomar mais consciência de que não só de bem-estar vive o ser humano. Também os homens e mulheres de hoje necessitamos cultivar o espírito, conhecer o amor e a amizade, desenvolver a solidariedade com os que sofrem, escutar a nossa consciência com responsabilidade, abrir-nos ao Mistério último da vida com esperança.

José Antonio Pagola